O cancelamento do plano de saúde sem prévia notificação ao consumidor é ilegal
A Lei dos Planos de Saúde, em seu artigo 13, parágrafo único, inciso II, veda, expressamente, a rescisão unilateral do contrato de prestação de serviços de assistência médica pela operadora de saúde. Prevê, no entanto, uma importante exceção: o contrato poderá ser cancelado se o segurado deixar de pagar por período superior a sessenta dias, consecutivos ou não, nos últimos doze meses de vigência do contrato, desde que o consumidor seja notificado até o quinquagésimo dia de inadimplência.
Na prática, porém, esse dispositivo legal não é cumprido pelas operadoras de saúde. Observa-se, frequentemente, que os planos de saúde, ante a verificação da inadimplência do segurado superior a sessenta dias, simplesmente cancelam o contrato, sem dar ciência desse fato ao consumidor. Certamente, o segurado somente toma ciência de que não está mais protegido pelo seguro no momento em que, efetivamente, necessita utilizar o plano e é surpreendido com a informação: "o seu plano está cancelado."
Pela simples leitura do dispositivo legal inicialmente mencionado, verifica-se que o cancelamento do plano, sem a notificação prévia do consumidor, é ilegal e abusiva. Embora as seguradoras aleguem que, quando o consumidor deixa de pagar uma mensalidade do plano, os demais boletos de cobrança contêm um aviso de que "existe(m) parcela(s) em atraso", esse simples alerta não supre a exigência legal de que, antes de ser efetuado o cancelamento do plano, o consumidor deverá ser notificado.
De fato, interpretando-se o artigo 13, parágrafo único, inciso II da lei 9.656/98, em conformidade com os princípios informativos do CDC, com os princípios da boa fé objetiva e da transparência, tem-se que a prévia notificação do consumidor deve ser: formal, realizada em documento próprio, destinado somente a esse fim; clara e inequívoca, informando o consumidor os meses que ele deixou de pagar, o tempo que ele está inadimplente e, ainda, o risco de o plano ser cancelado; e tempestiva, ou seja, feita até o quinquagésimo dia de inadimplência. Dessa forma, se a notificação enviada ao consumidor não cumprir, minimamente, esses três requisitos, o plano não poderá ser cancelado, mesmo se a inadimplência do segurado for superior a sessenta dias1.
Acerca do tema, uma interessante questão pode ser levantada: se o consumidor, por equívoco, deixar de pagar apenas uma mensalidade do plano, mas efetuar o pagamento das subsequentes, o plano poderá ser cancelado unilateralmente? A princípio, entende-se que o cancelamento unilateral do plano, nessas circunstâncias, também é abusivo. Sem embargo, tendo em vista a essencialidade do serviço prestado pelas seguradoras, a extinção do contrato, pelo mero inadimplemento, é desproporcional e acarreta gastos excessivos para o consumidor.
O cancelamento do contrato deve ser o último recurso da seguradora. Há, nessa hipótese, o que a doutrina denomina de "direito à manutenção do contrato", segundo o qual o fornecedor de serviços, ante o inadimplemento do consumidor de uma pequena parcela do valor devido, poderá valer-se das penalidades contratuais de natureza indenizatória e pecuniária, sendo-lhe vedado, no entanto, rescindir o contrato, tendo em vista a essencialidade do serviço prestado. Dessa forma, se o consumidor, de boa fé, deixa de pagar apenas uma mensalidade do plano, mesmo que por período superior a sessenta dias, tem ele o direito à manutenção do contrato, posto que houve o adimplemento substancial da obrigação.
O tema é de extrema importância, uma vez que, partindo-se do entendimento de que o consumidor tem o direito de manutenção do contrato nessa hipótese, disto decorre que eventual negativa de atendimento, em virtude do cancelamento abusivo do plano é, também, abusiva e, assim, gera dano moral indenizável, já que o STJ consolidou entendimento no sentido de que cabe indenização por danos morais "nas hipóteses em que há recusa injustificada de cobertura pelo plano de saúde para tratamento (...)"2.
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1 Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Quarta Câmara de Direito Privado. Apelação n° 994.09.272142-4. Desembargador Relator Francisco Loureiro. Data do Julgamento: 11/03/2010.
2 Superior Tribunal de Justiça. Terceira Turma. AgRg no Ag 1147125 / SP. Ministro Relator Massami Uyeda. Data do Julgamento: 08/09/2009. Dje: 02/02/2010.
Fonte: Migalhas
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